Cadê a casa que estava aqui? | Talks by LEIVA #27
uma reflexão sobre a especulação imobiliária e seu impacto na arquitetura
previously on Talks by LEIVA…
Não seja mais um no mercado de trabalho | Talks by LEIVA #26
(para falar conosco, responda esse e-mail ou escreva para contato@leivaarq.com)
Na penúltima quarta-feira fui surpreendida depois de uma semana sem ir na aula de patinação: a casa antiga, na esquina em frente ao ginásio, havia sido demolida. Anos de história, lembranças e vidas ali vividas foram apagadas em menos de uma semana. Por que? Ainda não descobri, mas acredito que dará lugar a um prédio, pois fica na área central da cidade.
Comentei isso com a minha mãe e ela respondeu que outra casa antiga, na vizinhança dela, que ela achava linda, também foi demolida. E nós moramos em uma cidade relativamente pequena, de 60 mil habitantes. Ainda assim, a especulação imobiliária é capaz de em poucos dias, destruir décadas de memórias.
Esse é um fenômeno que vem acontecendo há alguns anos em cidades grandes, como São Paulo, que têm bairros inteiros transformados em grandes canteiros de obras, com vizinhanças residenciais dando lugares a prédios caixotes em altura, com pouca ou quase nenhuma identidade.
Aí nós, arquitetos, podemos pensar: mas isso não é bom? Não aprendemos que uma cidade adensada, verticalizada, que usa a infraestrutura disponível na cidade é melhor que uma cidade periférica, que leva os moradores das classes mais baixas para longe de tudo?
Na teoria, sim. Na prática, não é isso que vem acontecendo.
No geral, esses prédios que vem tomando conta das cidades - Porto Alegre não virou um grande canteiro da Melnick? - são feitos para classe alta. Ou estamos falando de apartamentos enormes, que ocupam um andar inteiro e possuem duas vagas de garagem, ou, dos agora famosos, ‘studios’, que tem menos de 30m² e cada um desses metros quadrados custa muito, mas muito dinheiro.
Será mesmo que essas pessoas vão usar o transporte público? Ou estamos caminhando a passos largos para uma gentrificação dessas áreas?
Quem não viu no instagram a notícia de uma mansão assinada por Ruy Othake e Burle Marx que vai ser demolida para a construção de um condomínio? É de se indignar (e chorar no cantinho), pensar que nem uma arquitetura assinada por nomes de peso como esses possa ser conservada. Transformada em centro cultural, em um hotel que fosse, para guardar a memória e a história do nosso país.
Talvez eu esteja sendo um pouco extrema ou um pouco dramática, mas eu sou fã da arquitetura residencial. A casa antiga com telhado e varanda, a casa moderna que foi abandonada pelo banqueiro falido, sempre terão um valor imensurável para mim.
Por fim, deixo aqui uma reflexão de um prédio que está sendo construído em um contexto tombado, no centro histórico de Porto Alegre, que teve a compra do seu terreno feita no mesmo dia que uma alteração no plano diretor foi aprovado, retirando o limite de altura da área. (Sim, isso mesmo).
Porque além de todo o apelo da conservação da arquitetura, ainda temos a influência desse tipo de construção no seu entorno. Sombras projetadas, barreira da incidência solar, corredores de vento… Mas isso é assunto para outra conversa.